O mundo literário de A. Hanuc
- palavraeverso
- 4 de jun.
- 6 min de leitura
"Tento escrever de forma neutra, manipulando o tema na amplitude do meu imaginário."
A. Hanuc reside em Minas Gerais. Nascida entre montanhas, tem a imaginação tão hábil para voar quanto uma ave de rapina. Desde pequena, emprestava os ouvidos aos anciãos que contavam lendas macabras — e algumas belas histórias de amor. Cresceu namorando os livros que sua mãe guardava com zelo, e os versos que ela escrevia, dizendo terem sido copiados de algum lugar.
Hoje, A. Hanuc traz verdades de mãos dadas com a ficção e os pés sujos de poesia. Escreve para embrasear a valentia, num convite vitalício ao leitor: adentrar noutras dimensões de si mesmo e do universo. Faz o coração das rimas se apaixonarem e os parágrafos tremerem de assombro.
Não tem medo do escuro nem da incerteza, porque carrega sua própria luz. Interage com o agora e sua raridade, pois o instante seguinte é uma página pautada, sobre a qual se escrevem sonetos de esperança. Saboreia as lições da vida como se fossem café da manhã — sem comê-las tão depressa que lhe queimem a língua, nem tão devagar que deixem o café esfriar.
Dando sequência para nossa série de entrevistas com autores da Palavra & Verso, trazemos aqui um pouco da trajetória literária de A. Hanuc, bem como suas inspirações, seus próximos projetos, etc. Confira:

Palavra & Verso - O que te motivou a começar a escrever e quando percebeu que queria seguir carreira como autora?
A. Hanuc - Eu comecei a escrever aos sete anos de idade, após me alfabetizar. No início, eu ficava atrás da minha mãe enquanto ela fazia as tarefas domésticas, recitando versinhos e rimas que vinham na minha cabeça, até que um dia ela sugeriu que eu os escrevesse.
Fui influenciada pelo caderno de poesias que minha mãe guarda em sua caixa de recordações. Um manuscrito que ela confeccionou em sua adolescência, reunindo poesias, poemas, versos e sonetos diversos. Me apaixonei pela estética da poesia ao vê-la nas páginas desse caderno e pela musicalidade das palavras nesse arranjo. Eu adorava quando minha mãe lia essas poesias ou algum dos seus livros de contos para mim. Herdei dela o gosto pela leitura e escrita.
Os contos se manifestaram enquanto eu brincava de bonecas ou miniaturas. Eu ia narrando em voz alta, o enredo e as falas que vinham na minha imaginação; ouvindo isso, minha mãe achou que eu estava lendo algum livro da biblioteca da escola, mas quando descobriu que era uma de minhas criações, ela disse: “Ah, se isso fosse um livro!”. Então, além das poesias, eu passei a escrever contos também. Lia para a minha mãe cada capítulo, assim que eu terminava de escrevê-lo e, o interesse e empolgação dela me inspiraram a seguir carreira como escritora.
Palavra & Verso - Como a cultura e a realidade brasileiras influenciam a sua escrita?
A. Hanuc - A minha escrita carrega a influência da mitologia brasileira, misturada a elementos de culturas diversas. Somos um país laico, de cultura mista e receptivo a das imigrantes de qualquer nacionalidade, enriquecendo ainda mais a nossa diversidade e isso se reflete na construção dos meus personagens e cenários.
Em especial, na Saga Multiverso, a influência das lendas, crenças e costumes locais da comunidade rural no interior de Minas, onde eu fui criada, transbordam.
Palavra & Verso - Seu livro, O Diário de Eliz, mistura luto, horror e ficção cósmica. Como surgiu a ideia de conectar a perda pessoal de Queen com uma guerra entre forças sobrenaturais?
A. Hanuc - A base da Saga Multiverso é a filosofia holística, segundo o conceito do filósofo sul-africano Jan Smuts. Então, absolutamente tudo na Saga interconecta, abordagens, conceitos e crenças diversas, então a dor e o sofrimento foram trabalhados como mecanismos de ampliação da consciência humana. Por tanto, eu não queria que o meu leitor explorasse os mistérios da vida após a morte e entrasse noutras dimensões sozinho. Eu precisava de um personagem que se conectasse com o emocional do leitor, captando e representando suas incertezas e incredulidade em relação à morte. Por sua dor e paixão, Queen é a ponte entre o mundo natural (onde o leitor está) e o mundo sobrenatural (para onde ele irá, tanto na ficção quanto em suas crenças pessoais).
Palavra & Verso - O diário que dá título ao livro é quase um personagem por si só. Como foi o processo de criação desse artefato narrativo?
A. Hanuc - O Tessera a Mortuis ou livro do morto, foi inspirado no fenômeno paranormal da Psicografia, só que em vez de usar um médium como mecanismo para manifestar sua mensagem no mundo dos vivos, a alma desencarnada recebe um diário da entidade regente do mundo dos mortos, para se comunicar em casos raros que ameacem a integridade e a harmonia de toda a criação multiversal.
Palavra & Verso - A protagonista do livro um desbloqueia habilidades humanas especiais. Existe alguma simbologia por trás dessas “habilidades” e do papel dela como protetora da criança que pode unir galáxias?
A. Hanuc - As habilidades de Queen são adquiridas após sua alma deixar o corpo físico e ter contato com outra dimensão espiritual, representando uma experiência de quase morte (EQM). E pessoas que tiveram esse tipo de experiência relatam mudanças significativas em suas vidas e espiritualidade.
Palavra & Verso - Parélio expande o universo de O Diário de Eliz com geopolítica, invasões alienígenas e conspirações. Como foi a transição de uma narrativa mais pessoal para um enredo de escala global?
A. Hanuc - A morte de Eliz é uma das muitas tragédias que precedem ao advento do Apocalipse, mas esse fenômeno e seus elementos seriam insignificantes, sem a mudança de narrativa que dá ao leitor uma visão completa do cenário mundial durante o fim da humanidade.
Palavra & Verso - A Nova Ordem Mundial e o continente artificial trazem reflexões políticas importantes. Até que ponto essa ambientação dialoga com críticas ao nosso cenário atual?
A. Hanuc - Considerando algumas teorias conspiracionistas e textos religiosos, a falência do sistema político atual comprovaria a sua ineficiência, abrindo caminho para que uma nova filosofia política seja instaurada. Partindo dessa ótica, o aumento das guerras entre nações nos dias atuais alerta para a falta de cooperação entre países, o que pode levar a um colapso internacional e a melhor forma de resolvê-lo seria por meio de uma nova e moderna estrutura de governo. Além disso, a Saga também cita o surgimento de grupos rebeldes e violentos em conflito com as autoridades da própria pátria.
Palavra & Verso - Mafupa é uma entidade antiga e ameaçadora. Você poderia falar mais sobre sua criação e a importância dele como símbolo do horror no livro?
A. Hanuc - Uma das premissas da Saga é de que foi concedido ao homem certo conhecimento sobre a existência de seus algozes. E considerando que todos os povos carregam consigo histórias que descrevem um tipo de predador espiritual, Mafupa é a entidade que a todos representa.
Palavra & Verso - Que autores nacionais e internacionais você mais admira?
A. Hanuc - Minhas inspirações literárias são grandes autores como Rabindranath Tagore, Stephen King, Clarice Lispector, Augusto dos Anjos e Fernando Pessoa.
Palavra & Verso - Você segue uma rotina de escrita ou escreve quando a inspiração surge?
A. Hanuc - A inspiração surge, daí eu faço um rascunho com os tópicos principais e possíveis nomes dos personagens. Depois vou para a pesquisa para acrescentar umas pitadas de realismo nos lugares, fatos, costumes e etnia dos personagens.
Palavra & Verso - Qual foi o maior desafio durante o processo de escrita e publicação da sua obra?
A. Hanuc - O maior desafio é o tempo. Sou mãe solo e trabalho fora, então conciliar tempo entre todas as minhas tarefas e a escrita exige disciplina. Normalmente, eu escrevo à noite.
Palavra & Verso - Seus livros abordam temas complexos como multiverso, luto, política e invasão alienígena. Como você equilibra ficção e crítica social em sua escrita?
A. Hanuc - Os fatos fictícios das minhas obras são inspirados em pesquisas de situações reais com o objetivo de que o leitor formule sua crítica enquanto lê. Tento escrever de forma neutra, manipulando o tema na amplitude do meu imaginário, mas sem deixar minha opinião pessoal à mostra.
Palavra & Verso - Que conselho você daria para quem está começando a escrever agora?
A. Hanuc - Descubra o seu modo pessoal de organizar as ideias e a sua rotina de escrita. Buscar inspirações nas rotinas de escrita de outros autores pode ajudar a ter novas ideias, mas cada pessoa desenvolve um ritmo e uma rotina própria. Respeite a sua singularidade na escrita.
Palavra & Verso - O que podemos esperar dos seus próximos projetos literários?
A. Hanuc - Para a continuidade da Saga, os meus leitores devem esperar mais batalhas épicas, o surgimento de novas criaturas e uma ascensão noutras realidades do multiverso com vilões violentos e impiedosos. O leitor deve estar preparado para se ausentar da Terra e mergulhar no terror cósmico. Em especial, para o spin-off da Saga, haverá muita magia e horror num cenário de época.
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